quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Tendências da primavera

Estou aqui para falar sobre as novas tendências dessa primavera. Sem abandonar o papel higiênico – muito prático para o uso na cama – a primavera traz consigo a necessidade de andar sempre com lencinhos de papel na bolsa. Poderia ser papel higiênico, mas o deixemos para ocasiões e lugares mais íntimos, de noite na cama, por exemplo para não ficar tão deselegante sacar da bolsa um rolo todo amassado.
Sempre que vou ao mercado ou a farmácia fico em dúvida entre o lencinho de beijinhos, o listrado e o da vaquinha. Quando estou muito carente vou logo para o de beijinhos. Se é para uso em uma ocasião mais formal, nada cai tão bem quanto o listrado, claro. No caso de quem lida com crianças, o da vaquinha, do porquinho ou qualquer outro bichinho vai muito bem. Só nesse caso muito cuidado para que elas não comecem uma competição de 'quem tem mais ranho' para surrupiar os seus lencinhos de porquinho. Falando nisso, acabo de lembrar de Leandro.
Leandro era meu colega mais temido na quarta série. Não era pelo tamanho, ou porque se tratava de um 'mau elemento' ou cidadão de má conduta. Pelo contrário, Leandro era muito educado. Sua secreção nasal, não. Não sei se esquecerei de Leandro. Mas jamais poderei esquecer sua secreção nasal. A minha escola, na época, não tinha regras muito rígidas quanto aos lugares dos alunos nas classes, portanto poderíamos, de vez em quando, trocar de lugar. Certa vez, numa dessas trocas, Leandro estava sentado à minha frente. Nunca sozinho, claro! Sempre acompanhado de uma pequena amostra de ranho saindo pela narina, se não me engano a esquerda. Invariavelmente era de cor amarelo-esverdeada, muitas vezes assumindo a coloração verde com uma consistência espessa, como no dia em que Leandro virou para trás para pedir alguma informação ou fazer algum comentário. Não recordo que informação era, aliás, nem sei se ouvi o que Leandro falou tamanho temor que tomou conta de mim naquele momento: a secreção amarela esverdeada , aliás, mais verde que amarelo, enfim, uma secreção bem brazuca, estava ali imensa, bem gorda como se tivessem nela colocado colheres e colheres de fermento royal. Leandro falava alguma coisa, e eu, ali parada, corpo tenso à espera que o pior acontecesse: claro, o pior aconteceu. De repente, aquela secreção toda que se encontrava suspensa na narina de Leandro cai, com todo o seu torpor, na ponta da minha classe. Emudeci. Paralisei. Atingiu meu caderno. Algo menor que 1mm, mas atingiu. Naquele dia, como se tivesse tomado um grande porre, não lembro do desfecho da história, como limpei o caderno, como voltei pra casa. Aliás, da quarta série, não lembro de quase mais nada além da acusação injusta de colar na prova de geografia, as eleições para presidente (Brizola era candidato) e de Leandro, mais precisamente do ranho de Leandro, verde e amarelo, ou verde e às vezes amarelo. Um ranho patriótico e claro, primaveril.
Beju da Gorda

5 comentários:

  1. PODERIA SER UMA CRONICA NA FOLHA DE SÃO PAULO...DUVIDO TU MANTERES ESSE NÍVEL DE POSTAGEM... -MEDO DO LEANDRO-

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  2. Que coisa maravilhosa essa crônica. Escreves muito bem! Parabéns!

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  3. Que maravilha...!!!! Lança um livro com essas histórias...!!!

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