sábado, 20 de outubro de 2012

Acredite!

Não é de hoje que a humanidade produz frases partindo do nada para lugar nenhum. Mas da necessidade de entender a "moral da história", lá vai:

1) "Com os erros se aprende."
Moral da história: Se aprende a errar.

2)"Dê a volta por cima."
Suponhamos que alguém esteja em algum ponto e deve voltar. Voltar por cima implica num movimento de ascensão e queda. 
Primeira moral da história: além de voltar para o mesmo ponto você vai cair feio no final.
Outro fator é o trabalho desnecessário para voltar por cima. Ser humano não voa. Baratas voam.  Portanto, você precisará no mínimo de uma escada, quando não de um avião - muito mais caro que uma escada, diga-se de passagem. Como nos ensinam os coelhos e assaltantes de banco dos filmes americanos, que cavam imenso caminhos sob o solo, no fim do caminho sempre haverá algo: cenouras ou uma fortuna. 
Moral da história: voltar por baixo traz melhores possibilidades.

3) "Dê um passo a frente."
Humanos andam pra frente, caranguejos andam pra trás. O caminho que você já percorreu você conhece e sabe onde estão os buracos. Pra frente não.
Moral da história: os caranguejos são espertos.

4) "Siga em frente".
Nunca vi uma árvore cair em algum buraco, apanhar por ter entrado no lugar errado ou ter que refazer um longo caminho quando algo não dá certo.
Moral da história: Não é à toa que as árvores tem longa vida.

Beju da Gorda

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

No ônibus-avião do caminhoneiro



Santa Maria com destino a Porto Alegre. 18h. Sento-me confortavelmente na poltrona 12, corredor. Há tempos já não faço mais questão de sentar na janela, desde que não é mais permitido abri-las. Na hora da saída, a vantagem é sempre de quem está no corredor: o vivente é possuído por uma sensação de poder sobre o que está na janela: "pegaste a janela, ms eu posso travar tua saída", coisas de pessoas vingativas, não é o caso. Quando um ingênuo pum resolve passear pelo ônibus, já não há mais vantagem na janela, aliás, é decepcionante não poder abri-la nesse momento de angústia. Mas o que é um peido depois da invenção do diálogo?

- Em quanto tempo chega em Porto Alegre?
- Umas 4 horas, 4h e meia.
- Mas eu pedi pra eles calcularem o tempo. Não vai dar tempo. Eu pedi pra eles calcularem.
- O senhor vai pra onde?
- Vendinha (ou algo parecido), perto de Lajeado.
- Por que o senhor não pegou um Santa Cruz para Lajeado?
- Eles disseram que não tinha mais passagem. Eles querem é vender passagem. Esse ônibus tem que sair logo pra eu chegar, tomara que chegue voando. Já está atrasado pra sair. Tomara que saia logo pra dar tempo.
- (com esperança) O senhor ainda pode descer, já que o ônibus ainda não saiu.
- Não adianta, eu vou ter que ir de qualquer jeito. Vou pra Porto Alegre depois volto metade do caminho pra pegar meu caminhão. Ele só vai tá carregado as sete da manhã.
- (silêncio)
- Tomara que saia logo, já passou cinco minutos. Tomara que esse ônibus voe!
- Eles sempre dão esse tempo.
- Já tá atrasado, dá pra reclamar, mas não adianta. Tomara que esse ônibus vá voando.
- (silêncio emburrado).
- Não adianta reclamar, Ai, tá saindo, já tá atrasado. (pausa esperançosa para minha alegria) Mas não vai sair? Acho que agora vai. Tomara que voe!

Neste momento, abro o notebook para tentar trabalhar no meu texto, como se fosse possível. Por um momento de enorme ilusão, pensei que ao abrir o note, o desconfiômetro do ser ao lado seria automaticamente ligado. Falta de intuição maior nunca tive na vida.

 - Tomara que esse carro voe pra chegar logo e dar tempo.
 - (expressão de descontentamento acompanhada de suspiro irritado)
 - Eles só querem é vender passagem, não adianta, só querem vender passagem. Vou ter que pagar um hotel em Porto Alegre, uns 50, 60 reais, fazer o que. Tomara que esse ônibus voe!
 - (silêncio)

Ele finalmente para de falar. Eu, não tão tranquilamente e com dificuldade, faço retoques no texto em que estou trabalhando quando, de repente, me dou conta que em nenhum outro momento da vida o que eu escrevo fora tão interessante. Os olhos vidrados na tela do meu notebook. Invasão pouca é bobagem. Paro de escrever. Fecho a janela do meu texto e vou ler outro. Os olhos acompanham, não perdem nada. Tiro o outro texto, abro o facebook. O olhar vidrado na minha tela. Nenhum constrangimento. Nada, nadinha. Não cursou o módulo básico de comportamento no ônibus. Desisto. Fecho o notebook e finjo sono repentino. Viro a bunda gorda para o lado do vivente, com apenas um propósito: VINGANÇA! Mas por dez mil repolhos, flatos, onde estão vocês quando eu mais preciso? Nada. Nem sinal. A falta de sono me faz lembrar do início da conversa: "em quanto tempo chega em Porto Alegre? - 4h, 4h e meia"... 4h, 4h e meia...

TOMARA QUE ESSE ÔNIBUS VOE! TOMARA QUE ESSE ÔNIBUS VOE!


Beju da Gorda

sábado, 6 de outubro de 2012

Polícia para quem precisa!

Em Porto Alegre quem precisa de proteção policial é tatu de plástico. Quem merece suas cacetadas são os vândalos sem razão nenhuma que derrubaram um boneco inflável gigante. Se uma boneca inflável em tamanho normal faz a alegria de um homem, imagina um tatu de sete metros!! Compreensível a presença constante de um monte de policiais em volta. Proteção aos sete metros da mais pura felicidade que existe em você.
Os vândalos derrubaram o tatu sem razão. Vândalos destruíram um grande patrimônio cultural de Porto Alegre. Sem razão. Claro que a inutilização de um espaço público em que constantemente ocorriam manifestações culturais e políticas não é razão. Claro que a feira de economia solidária não faz falta nenhuma para quem nela consumia os produtos coloniais e para os seus produtores que ali expunham seus produtos e, portanto, não é razão. Tampouco existe razão alguma em ver o tatuzão como uma representação de toda a barbárie política acontecendo na cidade de Porto Alegre. E mesmo sendo, não há motivo claro para essa revolta. O povo não é feito pra isso, apenas para ser passivo e apático, é esse o seu papel. O papel do povo é chamar a todos de ignorantes, polícia e manifestantes, ou de analisar sobriamente a situação que de sóbria não tem nada. 
Não há sobriedade em uma polícia despreparada. Tão preparada que quando um amigo e eu fomos assaltados à mão armada tendo ele seu carro levado, não pudemos dar queixa sem ter o número da placa do veículo, que ele não lembrava pois o carro havia sido trocado no dia anterior. Mas, minha mãe e eu pudemos ser paradas por um carro dessa mesma brigada, sendo obrigadas a "sair do veículo com as mãos para cima" pois haviam furtado um carro idêntico ao que estávamos. Ao sair, me deparei com um policial armado. Mas... e a placa do carro? Por que nós fomos paradas por estarmos em um carro de mesma marca e cor ao roubado e meu amigo e eu não pudemos dar queixa por não lembrarmos exatamente o número da placa do veículo? Claro que isso não é nada. O carro do meu amigo não é um grande patrimônio cultural, e o fato de termos sido abordados por um sujeito armado também não é uma grande coisa. Afinal, não somos tatus e sequer somos de plástico. 
O problema não está apenas em Porto Alegre nem só no RS. O despreparo das polícias militares é algo assustador. Mas há exceções. Quando eu morava no interior do RS em uma casa localizada em um bairro razoável, por morar algum tempo só em uma casa sem segurança, ao desconfiar de algo eu chamava a polícia. E eles iam, prontamente, fazer uma ronda e retornavam a ligação para dizer que estava tudo bem. Ali, eu me sentia um pouco protegida pela polícia. O mesmo ocorreu quando entraram no pátio da casa da minha vizinha. Já quando eu morei no Morro da Penitenciária no Bairro Trindade em Florianópolis, ao ouvir um grito de socorro, liguei para a polícia e relatei o que ouvi. A resposta foi algo surreal: "se você ouvir de novo ligue outra vez e nós vemos o que fazer". O que é um pedido de socorro em um lugar onde nem os taxistas se arriscam ir antes das seis da manhã, não é mesmo? Claro que poderia ter sido eu a gritar socorro, poderia este grito ter sido o último de alguém, mas e daí? Não era eu! Assim como não fui eu a ser ferida pela polícia no dia quatro de outubro em Porto Alegre. Portanto, para mim, tanto faz, para mim é muito fácil ser sóbria e analisar a situação com polidez e palavras sensatas, afinal, sou prudente, não ajo por impulso ou necessidade. Quem tem necessidades? O povo da feira? Os artistas que perderam um espaço público? Os passantes que perderam um pouco de arte e produtos da feira? Não. O Tatu, ao qual é cedido o espaço público, aliás, a praça toda que poderia mudar de nome para não envergonhar Glênio Peres.
Sejamos sensatos, não derrubemos plástico.  Deixemos impunemente retirarem o pouco que ainda pertence ao povo. Enquanto tu olhas as coisas com prudência, tem alguém agindo e apanhando para que tu, amanhã talvez, voltes a ir na feira, possas ali apresentar teu espetáculo de rua, fazer tua intervenção, a divulgação do teu evento e alguma ideia, se algum dia tu vieres a ter alguma. Afinal, quem precisa de espaços públicos, não é mesmo?
Trocamos os papéis com os tatus: enquanto eles crescem e tomam as praças, nós, vamos pro buraco. É o povo cavando sua cova.

Beju da Gorda.